quinta-feira

Azar?

(Texto retirado da net e adaptado por mim )
Num modesto consultório médico, na periferia de uma grande Cidade, longe dos olhares atentos de uma população (desatenta aos "azares" da vida actual) entra uma prostituta e o seu cliente, nada habituado a estas andanças...
Pergunta a médica, dirigindo-se à prostituta que acompanhava o rapaz.
-A senhora sabe se é seropositiva?
-Sei, sei que não devo ser, fiz o teste há uns meses, e deu negativo -respondeu a mulher.
-Fizeram bem em procurar-me, apesar da simplicidade deste centro médico, temos os meios necessários, surgindo algum problema, sempre o podemos detectar, atempadamente – informou a médica, mostrando-se surpreendida, por ver aquele casal entrar-lhe porta adentro, mas ao mesmo tempo satisfeita, com a naturalidade com que o fizeram.
-Ai, Doutora, que o diacho do preservativo tinha de romper! – Lamenta o rapaz, em pânico.
– Acha que posso ter apanhado a SIDA? Estava a fazer sexo, menos convencional, percebe, não percebe, Doutora? É pior não é?? – Confundia o rapaz, habituado à educação convencional dos ensinamentos masculinos da família.
-Sabe, sempre aprendi que, em casa a mulher é para procriar, e maneira de o fazer só há uma, aquela por onde nascem os filhos -continuava, pelo efeito do nervosismo -E na rua, buscamos os de maior prazer, os proibidos no lar.
A prostituta acompanhava-o no silêncio, parecendo imune a emoções. Se mentia nas respostas não se notava, se sofria com a sentença não dizia, se ansiava um prognóstico omitia. Parecia indiferente a tudo e a todos que a rodeavam, um autismo apurado, fruto de longos anos de treino a que a obrigava a sua profissão.
O rapaz chorava. Dois anos na prisão por tráfico de droga, um azar, nem precisava de andar nessa vida, pois que os pais tinham posses, comerciantes conhecidos que eram, fora apanhado a fazer um favor a um amigo que sofria na ressaca e ansiava por uma dose.
E agora fora apanhado, novamente, mas na inconsciência dos seus tenros anos e do seu modelo de vida, pois que o pai também ia às putas, e gabava-se em casa em frente dos filhos homens, enquanto a mãe e a irmã, na cozinha, preparavam o cosido e temperavam os tomates para a salada.
– Ai, Doutora e agora? Não quero dar mais um desgosto à minha mãezinha, coitada. Já basta eu ter estado preso e agora isto…
E agora isto, o resultado foi positivo, o primeiro teste, e a médica guardava para si aquela informação, esperando a confirmação do resultado, sem querer alarmar antes da garantia, sem poder actuar antes de provas.

E se tudo aquilo lhe parecia estranho à luz dos seus comportamentos e valores, não deixou de pensar naquela vez, há muito tempo, muito mesmo, antes do marido e dos filhos, da licenciatura e do doutoramento, do apartamento na Lapa e o BMW na garagem, em que numa semana de Queima das Fitas, numa noite de bebedeira, o álcool e o desejo falaram mais alto e deu uma queca com aquele tipo que não conhecia de parte nenhuma. E ela, sim, nem sequer pediu para ele usar preservativo...

Há situações em que não se deve arriscar... Mas são um facto, porque existem, porque muitos de nós já as vivemos. E quem nunca pecou, que atire a primeira pedra...

Se para alguns é azar, para outros garanto... é uma sorte.

coragem